segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Cristal

Aquela moça bela,
Sim, aquela e não outra,
Aquela insegura e delicada,
mexe os lábios com tal devoção,

Parece que me canta uma canção

Aquela moça, discreta e delicada,
Caminha pela rua a passo incerto,
Olha prá minha vida atarantada
como se visse a morte

Ai moça, discreta e insegura,
Se este cortiço castigado e duro,
pudesse arcar por ti a desventura...
Que bela sorte seria, e tanto mais feliz.

Se ao menos entregasses um momento,
Ou eu por ti nesse Calvário
Farias do meu braço o teu escudo,
E eu do teu corpo um santuário,

Onde todas as noites rezarei
Para esquecer o que jamais serei.

Prendam o monstro!

Prendam o monstro
antes que se consuma,
Qual fogo-fátuo-auto-inflingido,

Prendam o monstro que ele se comove,
Cheio de comédias e farsantes,
Vistam-no de rubis e diamantes
E vejam como a própria língua engole!

Parem-no, que ainda se mata,
Pois dá-lhe pr'a viver onde se acaba,
O monstro está de casa aperaltada
Entra pela saída, sai pela entrada!

Matem-no, antes que vos coma,
Tal é a raiva que enerva o seu ventre,
Alimenta-se a pantufas e inocentes,
Qu'inda lhe sai o tiro pl'a culatra.

Metam-no a urinóis e naftalina
Em direcção à terra prometida
E em vez de morte saír-lhe-á vida
Na estepe infinita, onde o prazer se (é) taiga,

Lembrem-no que se leva ilusões,
Aí encontrará e com fartura,
Planícies desertas de verdura
Pedaços d'oxigénio aos montalhões!

O horrendo corpo que tão mal se aguenta
Nas curvas do desejo encontrará,
Em banhos de água pútrida lamenta,
A história, que por certo voltará.

Tragam-no ao porão bem amarrado,
Metam-no a cantigas curriqueiras,
Que a fama o tem fá por afortunado!