quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Lembrança

Lembro-me de tudo, querida,
Lembro-me de como aqueles
dias chuvosos na nossa cidade
maldita se tornavam
agradavelmente solarengos.
Lembro-me daquele dialecto
Estranho que falávamos e
Com o qual nos entendíamos
Como se crescêramos no mesmo
Berço.
Lembro-me de como uma
noite rodopiaste em torno
de mim como uma bailarina,
E como eu cerrava os lábios atónito,
E tu rodopiavas como o sol
Em torno da terra antes
De Copérnico.
Lembro-me de como te afagava os
Gritos com a minha boca.
Lembro-me como encostava
O meu tórax nas tuas costas
E assim os nossos diafragmas
Bailavam juntos.
Lembro-me como limpava
A última gota de gelado que
Deixavas no canto da boca
Com um beijo.
Lembro-me de como um
dia dizias que tudo era
de uma realidade tão irreal
que cortava a respiração... e
que o teu ser físico abandonaria
a cidade.
Depois... Depois era o silêncio,
E as ruas que se me compunham
nos olhos como uma teia, e
que tudo que me entrava
nos olhos feria, e a realidade
só fazia sentido contigo,
o ser mais irreal.
Lembro-me de como um dia
Deixei o meu nome escrito numa
Parede, onde antes existia também
O teu, e que um dia ficou apenas
o meu com as sua odiosas
sílabas.
Mas sabes, querida, se te serve
De consolo, talvez o tempo apague
Também o meu nome dessa
Parede, restando apenas eu,
Tu, e a cidade maldita...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Só há mar no meu país

Só há mar no meu pais,
Estendido e colossal,
Pois só assim se vê
O reflexo
Das almas dos seus filhos;

Só há mar no meu pais,
E correntes e marés,
E corpos que vagueiam,
E corpos que flutuam
Em estepes infinitas;

Há mar só no meu pais
Que inunda a massa amorfa,
Leve, monótono, enfermiço,
Arrastado e infeliz;

Mas se apenas em mar se fez história
...

Cesse!

Tenho fome,
Fome e sede de justiça,
Vontade e não saudade
De ir, perecer e sonhar;
Sede, não de água salgada
Mas de vinho envenenado;
Fome, não de troços e couves
Mas de ambrósia divina;

Sede e fome de história
Ou do frio sepulcral,

Sede e fome de glória
Ou desgraça colossal

Mas nem a desgraças te prestas
...
Pequeno Portugal