Não precisas dizer, Charles,
Bem sabemos que não vale a pena tentar,
Não precisas de contar histórias extraordinárias,
Seres sobre e sub-humanos,
As grandes façanhas, o holocausto,
O homem é monstruoso que chegue na sua dimensão,
Sabes, são duras,
Não as grandes dores, a morte dos pais, a morte de um filho,
Uma doença, mas as pequenas,
As de todos os dias,
O taxista o empregado de mesa –
Seres de suprema perspicácia -
Adivinham que és um zé
Ou então um discurso
- e todos aplaudem e gostam
E só tu ouves merda e queres gritar…
É duro, Hank,
A luz do frigorífico de todos os dias,
Os lamentos das donas de casa no metro,
As sopeiras na paragem de autocarro,
As adolescentes com bebés ao colo,
E escrevias um poema magnífico – como são os teus-
E saías à rua, não com a esperada bebedeira,
Mas lúcido como um alho – e o rapaz de fraque à porta
Vira a cara ao lado quando passas;
Esses olhares, Hank…
As pessoas não são parvas. Todos olham pela tua vida
Como se fossem Deus-Todo-Poderosos;
A rapariga ruiva enfezada que te olhou desdenhosa ontem, lembraste?
Percebe mais de fisionomias do que um frenologista.
Agora até as ameaças, não é, valentão?
Sabes bem porque é que elas não voltavam, não sabes?
Aquelas palavras meias ditas, aqueles gestos,
Bem sabias o que significavam,
Por isso desconfiavas, e com razão,
É um mistério, sabes…
Um comentário:
Bukowski é dos meus preferidos.
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